Editorial de “O Estado de São Paulo”, intitulado “As reivindicações do Ministério Público”, edição de 5 de fevereiro, conclui seu exame de declarações por parte do Procurador Geral do República Roberto Gurgel - a propósito de recursos financeiros e humanos para o bom funcionamento do Conselho Nacional do Ministério Púbico e, sobretudo, sobre a atuação investigativa do “parquet”, considerando que a razão está com o chefe da Instituição quando pleiteia mais recursos para Conselho Nacional Ministério Público, mas “parece” dela desmerecer “quando reivindica mais prerrogativas para sua corporação.”
O problema a enfrentar não se esvai com mais ou menos recursos, mas deve ser enfrentado tendo em vista a definição da real competência do Ministério Público, que não reivindica novas prerrogativas. Trata-se de uma instituição, segundo a Constituição de 1988, “essencial à função do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis” (artigo 127).
Anteriormente à outorga da atual Constituição, o Ministério Público já atuava independentemente da ação policial, como é possível constatar em inúmeros procedimentos iniciados com o objetivo de alcançar a apuração de delitos que se não fosse o poder investigativo do MP ficariam no esquecimento e seus autores impunes.
Recorde-se que, segundo o Código de Processo Penal, o promotor público pode apresentar denuncias baseado em elementos que não sejam colhidos pela polícia. Leiam-se os artigos 27 (provocação da ação do Ministério Público por iniciativa de qualquer pessoa do povo), 40 (provocação por parte de juizes que remeterão ao Ministério Público cópias de documentos necessários ao oferecimento da denúncia) e 41 (contem os requisitos para a denúncia e não fala em inquérito policial).
Acrescente-se que nos crimes praticados por policiais seria um contra-senso a obrigatoriedade da investigação por membros da corporação. Se assim fosse, não teriam sido desvendados os delitos cometidos por agentes policiais nas organizações criminais que se auto-denominaram “esquadrão da morte”.
A esse propósito, o Supremo Tribunal Federal já se manifestou inúmeras vezes pela jurisdicidade de ações penais intentadas pelo Ministério Público sem ou até mesmo contrárias às conclusões de inquéritos policiais.
A Constituição Federal dando, inclusive, ao Ministério Público atribuições para “exercer o controle externo da atividade policial” (artigos 129, VII), aponta, ainda uma vez, para a liberdade do “parquet” no desempenho de suas funções constitucionais.
O grande problema, se é que esse problema existe, pode ele ser encontrado na atuação firme do Ministério Público em não fazer distinção de pessoas na sua luta contra o crime. Quando o foco aparece centrado no crime chamado de “colarinho branco”, baseado no poder de que desfruta, a “elite” do crime se agita e procura abafar uma atividade fundamental na concertação democrática: uma justiça igual para todos e não só, como se tolera e até aplaude, contra os pobres e marginalizados. Quanto a estes não importa como se atua, pois o importante é afasta-los da sociedade dos “bons”.
O “Estadão”, ao desviar-se da linha que vinha percorrendo – lembre-se de seu irrestrito apoio às investigações feitas pelo Ministério Público a propósito dos crimes do “esquadrão da morte” e daqueles cometidos por políticos no exercício do Poder – presta ao abraçar a causa dos grandes contra o Ministério Público, um desserviço ao País.
Convém, a propósito, recordar que a memória de um jornal como “O Estado de São Paulo” vai muito além da memória de um editorialista.
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