A sociedade civil, usando de prerrogativas constitucionais que prevêem a participação popular no processo legislativo, elaborou e apresentou à Câmara dos deputados projeto de lei complementar alterando os termos da lei 64/99 – que dispõe sobre casos de inelegibilidade para cargos eletivos – para que não se dê registro a aspirantes a esses cargos que denotem em sua vida pregressa a falta de compromissos implícitos no desempenho de funções e cargos que pretendem ocupar, como mandatários da Nação, no Executivo, no Legislativo e no Judiciário.
Da mesma maneira que se exige para aqueles que desejam integrar a Magistratura, o Ministério Público e toda uma série de outros e relevantes cargos públicos, reputação ilibada, esta condição não poderá ser esquecida quando se trata de candidato aos postos eletivos do Executivo e Legislativo, nas esferas federal, estadual e municipal.
É o que impõe o artigo 14, parágrafo 9, da Constituição Federal, “afim de proteger a probidade administrativa a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou abuso de função, cargo ou emprego na administração pública direta ou indireta”.
Diante desse dispositivo que vai na linha constitucional da ética na atividade pública, não se pode admitir que postulantes a cargos eletivos, diferentemente de outros que se submetem a concursos públicos ou a exigências específicas, como é o caso dos ministros das Cortes superiores, obtenham o registro de suas candidaturas ainda que tenham praticado atos que não aconselham a sua participação na vida pública, tenham ficha policial a descrever atos contrários à moralidade ou tenham sido denunciados pelo Ministério Público pela prática de atos danosos aos bens públicos e até mesmo condenados nas instâncias inferiores do Poder Judiciário.
A referência ao disposto no artigo 5, LVII, da Constituição, segundo o qual “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença condenatória”, para exigir-se semelhante requisito como impediente único do registro, constitui-se num equívoco, primeiro, porque o aludido inciso LVII, do artigo 5, da Constituição, resguarda um direito fundamental, que é o direito à liberdade; em segundo lugar, porque a Constituição exige para o exercício da função pública comportamento ético, justamente, para que se alcance através da probidade do mandatário da sociedade civil, seja em quaisquer poderes da República, a maior lisura no exercício de suas atribuições.
Lamentavelmente, um projeto para corrigir os defeitos da lei 64/99 advindo da iniciativa popular, com mais de um milhão e meio de assinaturas, poderá não ter continuidade pois, não obstante ter voltado atrás em sua afirmativa anterior, o presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer, chegou a dizer que não submeteria o projeto ao plenário, porque não havia consenso entre os parlamentares sobre a matéria.
Isso é de se esperar do atual Parlamento onde, verifica-se, não existe clima, e não existirá nunca para aprovar um projeto de lei que busca impedir a candidatura de quantos já demonstraram por sua conduta, que fazem dessa Casa um balcão de negócios. Talvez a posição anterior do presidente da Câmara dos Deputados se deva ao receio de que a postura de seus pares na votação do projeto popular venha a macular ainda mais a reputação do Legislativo brasileiro.
Os meios de comunicação estão ausentes no apoiamento de um projeto que objetiva restabelecer a moralidade na administração pública em geral, diante, ademais, da passividade dos juizes eleitorais que preferem aceitar regras que vão na contra-mão das linhas inscritas na Constituição, no que respeita à obediência aos princípios que resguardam a probidade, a ética e a moral, no trato dos assuntos do Estado.
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