Como está escrito no Plano Nacional de Direitos Humanos, propõe-se instituir, dizemos nós com inexplicável atraso, uma Comissão da Verdade, encarregada de desvendar à sociedade brasileira o que aconteceu, do ponto de vista dos direitos humanos, durante os 21 anos de ditadura militar.
Para tanto, entendeu-se de propor a designação de um grupo de trabalho encarregado de elaborar projeto de lei que institua a aludida Comissão, de forma plural e suprapartidária, com mandato e prazo definidos, pra examinar as violações de direitos Humanos praticadas no contexto da repressão política durante a ditadura militar.
Essa proposta da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, sancionada por decreto da Presidência da República, recebeu a repulsa do Ministério da Defesa ao amparar a orientação dos chefes das Forças Armadas que não admitem, com base em distorcida interpretação da lei de anistia, a punição dos agentes do Estado que, para a manutenção do sistema ditatorial implantado em 1964, prenderam ilicitamente, torturaram e mataram tantos quantos se opunham ao jugo militar com o objetivo do retorno do País ao Estado de Direito Democrático. O decreto falava em “repressão política”.
A reação encontrou eco no signatário do decreto que, nessa parte o reformulou para, com a nova redação, “violações de direitos humanos”, poderá permitir um novo processo contra as vítimas da ditadura,num absurdo, bis in idem, inqualificável.
Aliás, se é interessante a criação de uma comissão da Verdade, com os objetivos anteriores aos do decreto que modifica o 3º Plano Nacional, é também de se ponderar que para a punição dos responsáveis pelos crimes da ditadura, basta aplicar-se o quanto dispõe a lei de anistia.
Seja-nos permitido afirmar que na sua conceituação mais realista do direito interno e internacional, a anistia, em hipótese nenhuma, pode beneficiar os agentes do Estado que violaram direitos humanos. Nesse sentido já se manifestaram a Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos, aconselhando e determinando aos Estados partes da Convenção Americana que elaboraram leis de anistia em benefício próprio que, nesse pormenor, fossem revogadas.
Na verdade, a interpretação sistemática da lei brasileira de anistia não leva ao entendimento de que se trata de uma lei que beneficia algozes e vítimas. Sob esse aspecto, quando a lei em questão fala em crimes conexos é preciso convir que a conexidade não pode ser encontrada quando existe diversidade de desígnios. Crimes conexos são aqueles em que seus partícipes procuram alcançar um objetivo. Ora, não se pode igualar os objetivos daqueles que lutaram contra a ditadura com os daqueles que pretendiam mantê-la.
A inexistência da alegada conexidade vem sendo reconhecida, não só pelo direito interno, quando interpreta a conexidade segundo dispositivos do Código Penal, mas por igual pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos, segundo tratados, convenções e protocolos de que o Estado brasileiro é parte.
Como se vê, não há como encontrar na proposta da instituição da Comissão da Verdade um novo viés para a impunidade de quantos, como agentes da ditadura militar, repita-se, prenderam, torturaram e mataram.
As considerações constantes, a respeito,do 3º Plano Nacional de Direitos Humanos, são coerentes com a pretensão de se restaurar a verdade e uma vez tornado claro esse propósito inexistem motivos para a manutenção de nomes de pessoas que praticaram crimes de lesa-humanidade em logradouros, atos e próprios nacionais e edifícios públicos.
É mais uma limpeza que se impõe.
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