O Brasil, sempre na mão de oligarquias, ora militares, ora civis, não caminha segundo as regras morais e éticas que devem qualificar a sua atuação internacional. Ainda há pouco, vimos a representação brasileira de direitos humanos em Genebra saindo-se com uma frouxa abstenção perante críticas que se faziam à situação de abandono em que se encontram, no Irã, os seus cidadãos, tendo-se em vista os direitos fundamentais da pessoa humana.
Mas existe muito mais fatos importantes que qualificam os Direitos Humanos e que aqui são sistematicamente ignorados. Fatos que os meios de comunicação noticiam por um instante, para deixar em seguida no esquecimento.
Nos últimos meses do ano passado, o Brasil recebeu severa condenação da Corte Interamericana de Direitos Humanos, da OEA, cuja jurisdição o País reconhece. Essa condenação implica, dentre outras coisas, numa reinterpretação da Lei de Anistia, para que se atenha, tão somente, a beneficiar quantos foram presos, torturados ou mortos (neste caso as famílias) durante os anos da ditadura militar.
Pois bem, até aqui, o que se fez? Nada. As coisas vão até ao ponto em que o ministro presidente do Supremo Tribunal federal (STF) vai a público, em entrevista à imprensa, afirmando que a pífia decisão daquele tribunal, que considerou a lei brasileira de anistia uma lei de “duas mãos”, será mantida, porque ele não reconhece a Corte Interamericana como uma 4ª Instância. Diz ele que se o problema voltar ao Supremo, será “naturalmente” rejeitado pelo Colégio.
Antes de mais, um juiz não decide em uma entrevista, nem adianta sua opinião fora dos autos. Depois, demonstra com sua atitude um completo desconhecimento do Direito Internacional.
A Convenção Americana sobre Direitos Humanos dispõe em seu artigo 67 que uma “sentença da Corte será definitiva e inapelável”. E logo a seguir: que os “estados partes na Convenção, comprometem-se a cumprir a decisão da Corte em todo caso em que forem partes”.
Em conclusão: o Brasil está, enquanto um dos Estados partes na Convenção Interamericana de Direitos Humanos, na obrigação de cumprir a sentença da Corte. Esta não está determinando ao STF que o faça, mas ao Estado brasileiro. Daí, a falta de sentido nas palavras do presidente do STF na aludida entrevista.
A decisão da Corte Interamericana, repita-se, não corrige ou modifica a sentença da Justiça brasileira. Ela vai muito além. Ela impõe ao Brasil medidas que devem ser cumpridas: a punição dos torturadores, com as devidas alterações na interpretação da Lei de Anistia, ou de seus termos para não permitir dúvidas acerca da questão de que a anistia não pode abranger os agentes do Estado que prenderam ilicitamente, torturaram e mataram para preservar a ditadura. Em outras palavras, a autoanistia pretendida é absurdo jurídico incompatível com o Estado de Direito Democrático.
Isto posto, convém assinalar que não se trata, agora, de buscar a solução do impasse segundo os interesses dos peticionários. Trata-se de uma questão jurídica que, como tal deve ser considerada. E sua conclusão só pode encontrar um desfecho que aponte pelo cumprimento integral da decisão.
Em suma, a partir do momento em que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) acionou a Corte, os peticionários aparecem na lide não mais como parte, mas como coadjuvantes; uma espécie de “amicus curiae”.
A solução apontada pela Corte é uma posição jurídica e nos seus termos deve ser tratada.
A maneira pela qual o Brasil vai considerar a questão não compete ao Ministério Público ou ao Judiciário, mas ao Estado brasileiro que assumiu compromissos internacionais, dos quais não pode fugir ou empurrar seu desfecho para as calendas gregas.
Na verdade, a atual política brasileira de Direitos Humanos permanece na tona de fatos irrelevantes, afundando quando se trata de sua essência.
A oportunidade para redimir-se está aí. É vital que se aproveite.
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