domingo, 10 de abril de 2011

Ainda a “ficha suja”

O ministro do Supremo, Fux, em entrevista ao jornal “Folha de S. Paulo”, afirma que não desempatou o julgamento sobre a validade da lei da ficha limpa para as eleições de 2010.

O julgamento que contava com cinco votos a favor da tese de que a lei em questão era válida para as eleições do ano passado, tinha os votos de cinco outros ministros que entendiam o contrário. Havia um empate que tolhia a tomada de uma decisão. Logo, aquele que tornado membro da Alta Corte, votasse de um ou de outro modo, daria o voto de desempate.

Não tem sentido, portanto, esquivar-se o ministro do qualificativo. A verdade é que este implica num julgamento ético: o desempatador preferiu a ficha suja à limpa.

Alega o ministro que o artigo 16 da Constituição estabelece que uma lei que altere o processo eleitoral só se aplicará à eleição que ocorra até um ano de sua vigência. A clareza meridiana mencionada pelo ministro não parece tão meridiana, tanto que pelo menos cinco ministros tiveram considerações opostas ao voto desempatador.

Aliás, já é tempo de considerar-se, na solução do impasse, que acima de uma lei ordinária está a Constituição, o que é até mesmo apodíctico (evidente). E, nesse caso, não é o artigo 16 que deve ser invocado, mas o quanto dispõe o artigo 14, §9º, quando fala que ao registro de uma candidatura sobrepõe-se o exame da vida pregressa do candidato. In literis: “Lei complementar estabelecerá (...) a fim de proteger a probabilidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato....”

Se esse exame não foi feito no tempo e na forma devidos, deverá sê-lo a qualquer tempo, com a cassação do mandato irregularmente outorgado (veja-se o artigo 15, I, II e III). Ademais, numa decisão do Supremo Tribunal Federal não deve apenas valer a lei, pois acima dela está a Constituição a impor, dentre outros princípios, que na administração pública deve-se obedecer, sobretudo, a moralidade e não se pode considerar moral a eleição de candidato com maus antecedentes.

A Justiça deve atender à lei e às demandas sociais, rejuvenescendo o ordenamento jurídico. Isto não quer dizer que os juízes têm coração e devem julgar segundo este, mas sim que precisam estar atentos para uma interpretação não gramatical das leis, mas para uma leitura delas que contemplam o bem público.

E foi o que não se fez. Deixou-se de lado a Constituição e optou-se pela lei da ficha suja.

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